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quinta-feira, 19 de março de 2015

POBRE MENINO RICO...



Pobre menino rico...

O menino nasce na melhor maternidade do Estado. Sua mãe se recupera da cirurgia enquanto familiares e amigos celebram a chegada do herdeiro com champanhe e coquetel. Enquanto isso, o menino fica no berçário, exposto em uma vitrine com a sua melhor roupinha.

Em casa, seu quarto de capa de revista o aguarda. Berço e cama da babá com enxoval personalizado, com o nome do bebê bordado em dourado. Babá eletrônica de última geração, para os pais acompanharem com atenção os cuidados da babá com o maior tesouro da família.

Depois de algumas semanas, mamadeiras e chupetas ortodônticas importadas substituem o peito materno, porque a mãe tem pouco leite. Mas não faz mal, o menino vai se consultar com o melhor pediatra que irá lhe receitar o melhor leite artificial do mercado.

Durante o dia, mãe e babá levam o menino para passear em seu carrinho de bebê importado. Frequentam os melhores clubes e shoppings da cidade. Enquanto a mãe compra as melhores roupinhas para o menino, a babá o distrai empurrando o carrinho. Em casa, os melhores brinquedos, com sons educativos, o mantêm entretido.

À noite, o menino chora. Quando colocado no berço, o berreiro é certo. A mãe se surpreende:
– A fralda está limpa! Não tem fome! Não tem frio! Parece que o berço tem espinho!
– É manha, alguém decreta.
– Deixa chorar que ele precisa aprender a dormir no berço, outro responde. Insegura, a mãe enfim concorda.

Quando completa um ano de idade, a família comemora o aniversário do menino no melhor buffet. 300 convidados o pegam no colo para o fotógrafo fazer o registro. O melhor fotógrafo da cidade é claro. Depois da festa, o menino chega a casa e se depara com centenas de presentes em seu quarto. E ele se distrai mais com os embrulhos do que com os brinquedos.

Agora o menino já anda e quer explorar o mundo por conta própria. Mas, mesmo no parque, precisa ficar no carrinho para não sujar as suas roupas caras. Praia, nem pensar! A areia e o mar são imundos e podem passar doenças. Em casa, é montada uma linda brinquedoteca, com piso emborrachado. É ali que ele deve brincar, em segurança.

Pobre menino rico. Tem tantos brinquedos, só não tem com quem brincar.

Os pais viajam com frequência, mas nunca levam o menino.
– Ele ainda não tem idade para aproveitar, diz o pai.
– Sim, ficará melhor em casa com a babá, seguindo a sua rotina, concorda a mãe.

Começa a falar e, quando chama a babá de “mamãe”, estranha que no dia seguinte aparece outra babá para o trabalho. Mal convive com o pai, que durante a semana chega do trabalho quando o menino já está dormindo. Afinal, precisa trabalhar bastante para garantir as melhores coisas para o menino: o apartamento no melhor condomínio, a melhor babá, o melhor clube, a melhor escolinha.

Aos finais de semana, o pai precisa relaxar. Sai com a mãe para festas e jantares com amigos. Como os ambientes não são apropriados para crianças, o menino fica em casa com a babá.

Perto dos dois anos de idade, o menino já não é mais tão bonzinho. Faz birra, faz malcriação, numa tentativa desesperada de chamar a atenção. Dão broncas, dão castigos, gritam:
– Menino ingrato! Tem tudo! Mimado!
Mas todos os brinquedos que tem não conseguem preencher o vazio que parece aumentar em seu pequeno peito.

O menino cresce mais um pouco e lhe enchem de atividades. Além da escola bilíngue, inglês, mandarim, natação e tênis. Precisa se preparar desde já para o mercado profissional. O menino ainda tenta explicar que prefere jogar bola quando não está na escola, mas não lhe dão ouvidos.

Pobre menino rico. Tem tantas ideias, só não tem com quem conversar.

Com o tempo, o menino desiste. A birra dá lugar à apatia. Passa o tempo livre na frente da TV, do computador, do videogame. Numa última tentativa de fugir da realidade.

Até que os pais percebem que tem algo errado.
– Esse menino não se interessa por nada, não ri! Como isso é possível? Nós sempre lhe demos tudo! Deve ter algum problema…

Levam o menino a um psiquiatra, o melhor da cidade. É diagnosticado com TDAH ou qualquer outro distúrbio comportamental. Os pais respiram aliviados.

– Eu sabia que ele tinha algum problema! E voltam para casa, satisfeitos, com a caixinha do remédio que o médico receitou.

Pobre menino rico. Tem tudo, só não tem o essencial.


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