NOSSA MEMÓRIA...
A memória é contrária
ao tempo.
Enquanto o tempo leva a
vida embora como vento, a memória traz de volta o que realmente importa,
eternizando momentos.
Crianças têm o tempo a
seu favor e a memória ainda é muito recente. Para elas, um filme é só um filme,
uma melodia, só uma melodia, ignoram o quanto a infância é impregnada de eternidade.
Diante do tempo,
envelhecemos, nossos filhos crescem, muita gente parte... Porém, para a
memória, ainda somos jovens, atletas, amantes insaciáveis...
Nossos filhos são
crianças, nossos amigos estão perto, nossos pais ainda vivem.
Quanto mais vivemos,
mais eternidades criamos dentro da
gente. Quando nos damos conta, nossos baús secretos – porque a memória é dada a
segredos... estão recheados daquilo que amamos, do que deixou saudade, do que
doeu além da conta, do que permaneceu além do tempo.
A capacidade de se
emocionar vem daí, quando nossos compartimentos são escancarados de alguma
maneira.
Um dia você liga o
rádio do carro e toca uma música qualquer, ninguém nota, mas aquela música já
fez parte de você... foi o fundo musical de uma amor, ou a trilha sonora de uma
fossa... e mesmo que tenham passado anos, sua memória afetiva não obedece a
calendários, não caminha com as estações: alguma parte de você volta no tempo e
lembra aquela pessoa, aquele momento, aquela época...
Amigos verdadeiros têm
a capacidade de se eternizar dentro da gente... É comum ver amigos da juventude
se reencontrando depois de anos... já adultos
ou até idosos... e voltando a se comportar como adolescentes bobos e
imaturos...
Encontros de turma são
especiais por isso, resgatam as pessoas que fomos, garotos cheios de alegria,
engraçadinhos, capazes de atitudes infantis e debilóides, como éramos há 20,
30, 40, ou 50 anos ...
A memória não permite
que sejamos adultos perto de nossos pais...
Nem eles percebem que crescemos... Seremos sempre as crianças, não importa se
já temos 30, 40, 50 anos...
Pra eles, a lembrança
da casa cheia, das brigas entre irmãos, das estórias contadas ao cair da
noite... Ainda são muito recentes, pois a memória amou, e aquilo se eternizou.
Por isso é tão difícil
despedir-se de um amor ou de alguém especial que por algum motivo deixou de
fazer parte de nossas vidas.
Dizem que o tempo cura
tudo, mas não é simples assim. Ele acalma os sentidos, apara as arestas, coloca
um band-aid na dor,,,
Mas aquilo que amamos
tem vocação para emergir das profundezas, romper os cadeados e assombrar de vez em quando
Somos a soma de nosso
afetos e aquilo que amamos pode ser facilmente reativado por novos gatilhos :
Somos traídos pelo enredo de um filme, uma música antiga, um lugar especial.
Do mesmo modo, somos
memórias vivas na vida de nossos filhos, cônjuges, ex-amores, amigos, irmãos...
E mesmo que o tempo nos
leve daqui, seremos eternamente lembrados por aqueles que um dia nos amaram.
Adélia Prado – Aroma de
Poesias. (Hackmey)
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