SERAPIÃO!
Serapião era um velho mendigo que perambulava pelas ruas da
cidade. Ao seu lado, o fiel escudeiro, um vira-lata que atendia pelo nome de
Malhado.
Serapião
não pedia dinheiro.
Aceitava
sempre um pão, uma banana, um pedaço de bolo ou um almoço feito com sobras de
comida dos mais abastados. Quando suas roupas estavam imprestáveis, logo era
socorrido por alguma alma caridosa.
Mudava a apresentação e era alvo de brincadeiras. Serapião era
conhecido como um homem bom, que perdera a razão, a família, os amigos e até a
identidade.
Não
bebia bebida alcoólica, estava sempre tranqüilo,mesmo quando não havia recebido
nem um pouco de comida.
Dizia
sempre que Deus lhe daria um pouco na hora certa e, sempre na hora que Deus
determinava, alguém lhe estendia uma porção de alimentos. Serapião agradecia
com reverência e rogava a Deus pela pessoa que o ajudava.
Tudo que ganhava, dava primeiro para o malhado, que, paciente,
comia e ficava a esperar por mais um pouco.
Não
tinha onde dormir, onde anoiteciam, lá dormiam. Quando chovia, procuravam
abrigo embaixo da ponte e, ali o mendigo ficava a meditar, com um olhar perdido
no horizonte.
Aquela
figura me deixava sempre pensativo, pois eu não entendia aquela vida
vegetativa, sem progresso, sem esperança e sem um futuro promissor.
Certo dia, com a desculpa de lhe oferecer umas bananas fui bater
um papo com o velho Serapião.
Iniciei
a conversa falando do Malhado, perguntei pela idade dele, o que Serapião, não
sabia. Dizia não ter idéia, pois se encontraram um certo dia quando ambos
andavam pelas ruas e falou: Nossa amizade começou com um pedaço de pão, ele
parecia estar faminto e eu lhe ofereci um pouco do meu almoço e ele agradeceu,
abanando o rabo, e daí, não me largou mais.
Ele me ajuda muito e eu retribuo essa ajuda sempre que posso.
Curioso
perguntei: Como vocês se ajudam? Ele me vigia quando estou dormindo; ninguém pode
chegar perto que ele late ataca.
Também
quando ele dorme, eu fico vigiando para que outro cachorro não o incomode.
Continuando
a conversa, perguntei: Serapião, você tem algum desejo na vida? Sim, respondeu
ele - tenho vontade de comer um cachorro quente, daqueles que a Zezé vende ali
na esquina. Só isso? Indaguei.
É, no momento é só isso que eu desejo. Pois bem, vou satisfazer
agora esse grande desejo. Saí e comprei um cachorro quente para o mendigo.
Voltei e lhe entreguei. Ele arregalou os olhos, deu um sorriso, agradeceu a
dádiva e em seguida tirou a salsicha, deu para o Malhado, e comeu o pão com os
temperos.
Não
entendi aquele gesto do mendigo, pois imaginava ser a salsicha o melhor pedaço,
não contive e perguntei intrigado:
Por
que você deu para o Malhado, logo a salsicha?
Ele
com a boca cheia respondeu: Para o melhor amigo, o melhor pedaço! E continuou
comendo, alegre e satisfeito.
Despedi-me do Serapião, passei a mão na cabeça do Malhado e sai
pensando...
Aprendi
como é bom ter amigos. Pessoas em que possamos confiar.
Por
outro lado, é bom ser amigo de alguém e ter a satisfação de ser reconhecido
como tal.
Jamais
esquecerei a sabedoria daquele eremita:
"PARA
O MELHOR AMIGO O MELHOR PEDAÇO"
Espero que sejamos mais um Serapião.
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