Como Orar?
“ Quantos, dentre nós, limpam as mãos de dívidas,
agradecendo a Deus cada benção individual recebida durante o dia? ”
A oração é um ponto grandemente controverso da
prática religiosa, seguido ou negado francamente.
Aqueles que utilizam a oração como argumento contra
a existência de um Deus inteligente, ou de qualquer Deus, afirmam que as
orações seriam logicamente razoáveis e eficientes se Deus existisse. São muito
perspicazes ao declarar que setenta e cinco por cento das orações ficam sem
resposta ou são aparentemente negadas.
Sou um crente firme na oração e o leitor também
poderá ser, se der à oração a devida oportunidade para demonstrar a sua
eficácia. Acusamos erradamente muitas coisas de serem ineficientes e recusamos
a aceitá-las, depois de apenas umas poucas tentativas de usá-las ou
demonstrá-las. A razão disso é a nossa própria ineficiência e ignorância.
Nessas circunstâncias, surpreende-me que tantas orações sejam atendidas.
A compreensão do que realmente é a oração e de como
usá-la falta de tal modo no indivíduo comum, que é realmente surpreendente que
uma, dentre mil, traga quaisquer resultados. Nas igrejas, são usadas certas
preces fixas feitas por pessoas que parecem mais interessadas na eloquência
florida do que na verdadeira oração. Jesus ensinou aos seus discípulos como
orar, e a versão correta das suas instruções e os exemplos que deu ao mundo são
diferentes das preces proferidas por aqueles que se afastaram do misticismo
fundamental da oração.
A prece baseia-se na suposição de que Deus é
onipotente, onipresente e deseja atender às nossas súplicas. Essa é toda a
suposição ou base que necessitamos na oração; penso, porém, que o leitor
concordará em que a média das pessoas tem em mente algo mais. Tem em mente não
só que Deus é onipotente, onipresente e misericordioso, mas, também, que, com
toda a sua harmonização com os seres que criou, ignora, ainda, as suas
necessidades, desconhecendo completamente o que necessitam na vida!
Este é o grande erro. Entregarmo-nos à oração com a
crença ou sensação de que Deus não sabe o que necessitamos ou o que é melhor
para nós e devemos dizer-lhe e explicar-lhe o que desejamos, é cometer um grave
erro.
Considerando o assunto do ponto de vista puramente
razoável e sensível, não parece estranho que uma pessoa se ajoelhe e peça a
Deus que não tire a vida de alguém que acabou de sofrer um acidente? Orar a
Deus em tal ocasião e quase ordenar -lhe que não permita que a vida abandone o
corpo dessa pessoa ou que certas condições se manifestem, é presumir que nós,
com a nossa compreensão finita, sabemos, melhor do que Deus, se certas coisas
devem, ou não, acontecer.
Se a pessoa foi ferida, está prestes a falecer e
Deus não impede que isso aconteça, por que deveremos presumir que Deus modificará
Seu modo de pensar quanto à transição, permitindo que a pessoa viva, unicamente
porque pedimos que a sua vida seja salva? Pense em duas pessoas, em lados
opostos, cada uma pedindo forças a Deus para que seja o vencedor numa luta
entre elas.
Se Deus deve decidir a luta, não é melhor presumir
que o Seu julgamento das condições e princípios em ação será suficiente para
escolher a pessoa que deverá vencer? A oração, por ambas as partes, não poderá
ser satisfatoriamente atendida, pois ambas não poderão sair vencedoras.
O místico sabe que qualquer oração ou súplica
baseada na suposição de que Deus ou o Cósmico não sabe o que é melhor e deve
ser orientado ou aceitar recomendações ou sugestões é perdida e inútil. Na verdade, isso
representa uma censura à inteligência divina e não vai além do campo das nossas
ambições pessoais. Certamente, semelhante prece não pode ser proferida
sinceramente ou merecer a aprovação Cósmica. Está fadada a fenecer ou a não ter
resposta, no próprio momento em que é concebida.
Um Encontro de Mentes
Para o místico, portanto, a oração é um encontro de
mentes. Não é ocasião para pedidos pessoais, mas para comunhão espiritual,
ocasião em que a alma e a parte mais íntima de nós mesmos, reverente, sincera e
tranquilamente, falam a Deus e expressam os desejos do nosso coração e mente.
Qualquer consideração de que a nossa concepção
humana das nossas necessidades deve ser exposta em detalhes ou feitas sugestões
ou recomendações, seria tão incompatível com a atitude verdadeira de orar, que
desvirtuaria a oração e impediria a realização do que desejamos.
A prece, portanto, deve ser a expressão do desejo
de uma bênção. Tenho eu qualquer direito de me dirigir a Deus, como faço na
oração, e exigir ou mesmo pedir que me seja dada uma vida mais longa, porque
esse é o meu desejo e cheguei à conclusão de que devo ser atendido? Não é isso
concluir que Deus pode não ter pensado em dar-me vida mais longa ou pode ter
decidido de outro modo, e desejo modificar a decisão e decreto da Sua Mente?
Não é isso uma obstrução ao próprio efeito que desejo criar na consciência de
Deus?
Tenho eu qualquer direito de me dirigir ao Criador
de tudo e dizer que desejo isto ou aquilo de um modo que indica que decidi a
respeito dessas coisas, ou solicitar que a Mente Divina aceite o meu
discernimento em vez do Seu próprio?
Estou certo de que se pensássemos em nos aproximar
do rei de um país ou do presidente de uma república, cujos favores nos tivessem
sido concedidos no passado e de cuja generosidade muito tivéssemos nos
beneficiado, entregar-nos-íamos à oração de modo muito diferente.
Se tivéssemos recebido muitos favores de um rei e
nos fosse permitido ir à sua presença para alguns momentos de comunhão,
encontrar-nos-íamos, provavelmente, proferindo antes de mais nada, palavras de
agradecimento pelo que recebemos – acrescentando que, se fosse da vontade real,
ficaríamos muito felizes se pudéssemos continuar a merecer as mesmas bênçãos ou
possivelmente mais.
Nenhum de nós pensaria em solicitar bênçãos
específicas sem, primeiramente, ter expressado profundo agradecimento pelo que
já receberemos e sem declarar que, embora desejássemos a continuação dos
favores reais, não tínhamos direito de pedir mais.
Quantos, dentre nós, oram com esta atitude?
Quantos, dentre nós, limpam as mãos de dívidas, agradecendo a Deus cada bênção
individual recebida durante o dia? Afirma-se, como norma legal, que não podemos
ir a uma corte e solicitar justiça, a menos que a evidência de termos feito
justiça a outros indivíduos prove que a merecemos. Como nos dirigimos a Deus
em nossas orações?
É verdade que o pecador e aquele cujas mãos e alma
estão enegrecidas pelo mal podem se dirigir a Deus da mesma maneira que aquele
que está puro e perfeito, mas, esse pecador deverá, primeiramente, buscar, na
misericórdia de Deus, o perdão que não poderá encontrar nas cortes de justiça
dos homens. Sua primeira prece deverá ser de arrependimento e remorso, com um
pedido de graça divina, de modo a poder comparecer diante de Deus purificado e digno de novas bênçãos.
Até certo ponto, somos todos pecadores e, para
termos certeza de que compareceremos diante de Deus com direito a bênçãos,
nossa primeira súplica deverá ser de perdão e graça, acompanhada de um sincero
sentimento de apreciação pelas bênçãos já recebidas.
Se nos dirigirmos a Deus deste modo, é mais do que
provável que ficaremos tão impressionados com a magnificência da nossa
participação na vida e com a sublimidade das bênçãos divinas já desfrutadas,
que nos esqueceremos das coisas de menor consequência que pretendíamos pedir. É
também provável que, se analisarmos a nossa vida nas últimas vinte e quatro
horas e nos julgarmos corretamente, chegaremos a compreender que não somos
dignos de maiores bênçãos – já tendo recebido muito mais do que poderemos
compensar ou, mesmo, merecer.
Nosso pecado poderá consistir, principalmente, de
omissões. A dádiva e bênção de viver com a consciência e atividade plena de
todas as nossas faculdades acarretam uma obrigação de trabalho, em nome de
Deus, para benefício da humanidade. Se recebermos bênçãos sem termos prestado
algum serviço, ou devotado alguns dos nossos poderes e faculdades ao benefício
de outros, seremos pecadores, embora possamos não ter cometido ato evidente ou
violado qualquer determinação Cósmica.
Devemos estar seguros de termos adquirido
merecimento e obedecido, antes de podermos, razoavelmente, esperar que as
nossas preces sejam consideradas. Não deverá haver hipocrisia no coração ou
mente, auto decepção ou exaltação. Não deverá haver qualquer humilhação; por
isso que a grandiosidade e a bondade de Deus, em nós, coloca o Homem acima da
humilhação, se ele devidamente considerar a sua relação para com Deus. Deverá
haver, todavia, humildade de espírito, simplicidade de mente, pureza de
coração.
Nossas orações deverão ser expressões de desejos de
maiores bênçãos, com o pensamento: “Seja feita a Vossa vontade, não a minha”,
dominando a nossa mente. A expressão simples: “Se for da vontade do Pai, volte
a saúde ao meu corpo” é uma súplica muito mais contrita, sincera e digna do que
uma que exija ou sugira que Deus modifique a lei que se acha em operação,
coloque de lado certas condições específicas e estabeleça outras, simplesmente
porque é esse o nosso desejo e a nossa conclusão.
O vaidoso que chegou à conclusão de que ele, entre
todos os outros, deve ser o vitorioso, não deve suplicar a vitória, mas que
Deus conceda a vitória àquele que tenha mais merecimento e seja mais digno. Não
só deve a vontade de Deus ser o fator decisivo, mas, também, a todos os outros
deve ser concedido aquilo que merecem e verdadeiramente necessitam, quer tenham
orado ou negligenciado fazê-lo. A oração jamais deverá ser egoísta e pessoal ao
ponto de excluir os demais, especialmente aqueles que estão em maior aflição e
necessidades do que aquele que faz a súplica.
Gosto de pensar na oração como raro privilégio de
uma entrevista pessoal com o Rei dos Reis e o Senhor das Hostes e que me foi
proporcionada a oportunidade de pedir uma graça ou fazer uma súplica nessa
entrevista. Deverá ser a mesma coisa que eu próprio concederia ao mundo e a
todos, se fosse o rei.
Quando um pedido sobre a súplica que farei,
sinto-me, muitas vezes, impressionado com o fato de que não há nada que mais
deseje do que as coisas almejadas por inúmeras pessoas. Se apenas uma súplica
puder ser feita e uma bênção concedida, deverei ser suficientemente honesto
para pedir que seja concedido a outros, e não a mim, aquilo que pedem.
Embora cada ocasião possa se constituir em
entrevista privilegiada por meio da qual entraremos em comunhão pessoal com o
Governador do Universo, poderemos estabelecer essa comunhão muitas vezes ao
dia. Esta é a maior bênção e dádiva além da própria vida; não obstante, poucos
a apreciam em ocasiões de paz, saúde e felicidade. Recorrem a ela somente
em momentos de tristeza, atribulações e penas.
Aprendamos a orar e a fazer da oração uma comunhão
real e um transbordamento da nossa mente, em pureza e humildade. Essa será uma
das perfeitas ocasiões de contato Cósmico. Para o místico, é um momento
transcendental em nossa existência terrena.
Por H. SPENCER LEWIS, FRC.
Compartilhado - AMORC
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