CASTIGO PRA PENSAR... NEM PENSAR!!!
Pense bem
antes de mandar seu filho pensar sobre um erro que ele cometeu. Você acha mesmo
que ele está preparado pra isso?
Castigo: pena ou punição que se
inflige a pessoa ou animal.
Pensar: submeter ao processo de raciocínio lógico; ter atividade psíquica
consciente e organizada; exercer a capacidade de julgamento, dedução ou
concepção; refletir sobre, ponderar, pesar.
Então, vamos pensar juntas. Você vê alguma relação possível entre o
substantivo e o verbo descritos acima pelo dicionário?
Enquanto o castigo representa um ato de repreensão, portanto, algo que
não é bem-vindo (afinal, ninguém quer ficar de castigo), o pensar indica uma
atitude enriquecedora, profunda, madura e reveladora. Não é assim? Mas aí vêm
as supernannies (as superbabás que acham que detêm as chaves secretas da
educação) com seus manuais e decretam “quando seu filho fizer algo errado,
coloque-o no cantinho do castigo para pensar”.
Pensemos nós que somos adultas: Você acha
mesmo que seu pequeno de 3 anos vai usar aqueles minutos de isolamento pensando
no que fez, refletindo sobre as consequências dos seus atos e voltar dali uma
criança melhor, mais bem-educada? Não, não vai.
E quem faz esta afirmação são os
especialistas no assunto. “Botar uma criança pequena para pensar no que fez só
serve para dar uns minutos de descanso para a mãe, não tem função educativa,
porque a criança só consegue pensar sobre o que fez e só compreende o sentido
moral das regras e dos valores a partir dos 6, 7 anos”, explica nossa
colunista, a psicóloga e pedagoga Elizabeth Monteiro, mãe de Gabriela, Samuel,
Tarsila e Francisco.
“Não gosto das supernannies, o que elas fazem é adestramento, e quem faz
isso com uma criança não conhece seu desenvolvimento cognitivo, psíquico e
intelectual.
” Do ponto de vista emocional, deixar a criança sozinha não deveria ser
um castigo, mas um privilégio.
“Quando a gente coloca a criança
para pensar mostra que não quer ficar com ela. E se ela não pensou quando bateu
ou mordeu ou fez algo errado, por que vai pensar agora? Como dizia minha mãe,
ela fica pensando na morte da bezerra e não no que você pediu.
Terminado o período de prisão,
ela fica livre para fazer tudo de novo.
Não houve
uma atitude educacional” pondera a doutora em psicologia escolar Luciene
Tognetta, mãe do Gabriel.
O pensar, que é uma coisa tão boa, uma elaboração, um sinal de
inteligência e crítica, acaba virando um castigo. Como a criança só passa a
refletir realmente sobre seus atos a partir dos 6 anos, sabe o que ela faz
quando vai parar no tal do cantinho? Cria mecanismos automáticos para se livrar
da punição. “Já pensei, posso sair agora?”, diz sem acreditar no que está
dizendo. O papel dos pais é fazer o filho entender os próprios sentimentos para
que ele aprenda a nomear suas
emoções.
Dizer a ele frases do tipo:“Você está triste
porque seu brinquedo quebrou, você está irritado porque quer dormir, você está
bravo porque eu não deixei você fazer o que queria. Essa é a principal função
da mãe até os 5 anos. É muito mais importante do que fazer a criança pensar
sobre um erro. Você está com ela criando associações”, ensina Betty.
Criança é do contra
O castigo é importante, sim, e funciona desde que tenha uma
correspondência direta com o erro. Ele deve ser educativo e não punitivo. “A
partir dos 3 anos, a criança já fica mais solta e tem percepção do que agrada
ou não os pais. Antes disso, o “não “ é muito importante, porque é o primeiro
organizador psíquico. Até os 4, 5 anos de idade, a criança é naturalmente
oposicionista, em outras palavras, é do contra. Acha que é o centro do universo
e as pessoas estão ali para servi-la”, explica Betty. Quantas vezes por dia seu
filho diz “mãe, tô com fome”, “mãe, pega isso pra mim”, “mãe, vem aqui”?
Segundo a psicóloga, essa é uma característica egocêntrica, o
que é bem diferente de ser egoísta. E aí os pais se confundem, rotulando o
filho de egoísta por não querer dividir o brinquedo com um amigo, por exemplo.
“Nunca se deve rotular a criança, porque o
rótulo é pra sempre”, diz Betty.
O uso do “não”, no entanto, deveria ser menos banalizado. Há mães que
dizem tantos, mas tantos, diariamente, que a criança nem dá mais importância.
Diante de uma birra, uma boa alternativa é desviar o foco dela para outra
atividade. “Mães que falam “não” demais acabam perdendo a autoridade. Ele
precisa ser deixado para situações importantes, que não faltarão ao longo da
infância e da vida adulta. Se o filho está mexendo na sua porcelana – que pra
ele nada mais é do que um brinquedo –, tire o objeto de suas mãos, diga que é
algo de que você gosta muito, que não quer que quebre e ponha em um lugar
inacessível. Assim, você irá economizar muitos nãos inúteis.
Sujou? Limpa!
A criança sujou a parede? Então, faça-a limpá- la – do seu
jeito, claro, sem exigir um trabalho impecável, pois o que vale aqui é a
intenção mesmo. Deu um tapa em você?
Segure as mãozinhas dela, olhe bem nos seus olhos e diga “eu não quero que você
faça isso, a mamãe não faz isso (desde que você não faça mesmo). Estou muito
brava”. E fique séria, seja firme. Essa é a tal correspondência direta com o
erro. Desde muito cedo, a criança percebe quando seu comportamento deixa a mãe
triste ou feliz. Por isso, é tão importante sinalizar imediatamente. “Você fez
isso, é feio, a mamãe não gosta”. Mas atenção: mostrar que não gosta do que ela
fez e jamais deixar a mínima dúvida do seu amor por ela. Nunca dizer “a mamãe
não gosta de você porque você fez isso”. Nunca!
Um grande equívoco é os pais punirem o filho privando-o de alguma
atividade que lhe dá prazer e não tem absolutamente nada a ver com o erro
cometido. Vocês foram ao supermercado, ele fez birra porque queria determinado
chocolate que você não comprou e então você tira o videogame por dois dias.
“Mas qual é a relação da birra com o jogo? Nenhuma. Então, o castigo é dizer
que você não vai mais levá-lo porque ele não sabe se comportar naquele lugar”,
ensina Betty. Agora, e a criança está mal na escola por causa do videogame ou
da televisão, aí sim é preciso interferir. “Sempre haverá uma escolha a fazer.
A mãe pode dar a opção de ele estudar e depois ver TV ou ficar sem TV”, sugere
Luciene. “O castigo não deve ser dado sem que a criança tenha condição de
reparar o erro, de se responsabilizar por ele, por isso, falou um palavrão,
deve conversar com quem ofendeu.” E não é isolando a criança em um cantinho que
você vai fazê-la entender um erro. O pior é ela até se acostumar com aquela
punição e esperar por ela com a maior naturalidade. “Há crianças que se
conformam, tanto faz ficar ou não de castigo, e há aquelas dão um jeitinho de
fazer algo errado escondidas dos pais, quando eles não estão vendo”, conta
Luciene, que deixa uma pergunta: E quando essa criança crescer ela vai achar
que pode fazer coisas erradas quando ninguém estiver olhando? Essa é pra gente
pensar!
Combinações
Com crianças maiores, é possível fazer combinações, mas que
sejam boas para os dois lados. De horários de estudo, por exemplo. Mas não
adianta você definir um período em que seu filho vai estar interessado em outra
coisa e não vai estudar. Pergunte a ele, deixe-o decidir quando se sente melhor
para enfiar a cara nos livros. Mas também deixe claro que combinados não se
quebram, porque aí quebra-se algo essencial em qualquer relação: a confiança.
Dicas de experts
Mude o foco:
Quando a criança insiste em mexer em algo que não deve, distraia
a atenção dela com outra coisa em vez de ficar gritando “Não mexe”.
Combine:
Seu filho tem que estudar, mas deixe que ele escolha o horário
mais conveniente, desde que você concorde com isso.
Não faça:
Colocar a criança de castigo no berço vai fazê-la associar o
sono a algo ruim.
Não rotule:
Se você ficar chamando seu filho de egoísta, preguiçoso, burro,
é isso que ele vai ser. O jovem e a criança não sabem quem são, é o adulto que
diz quem ele é.
Fique fora:
Se seus filhos estão brigando, não interfira. Eles querem chamar
sua atenção.
Não a deixe chorando:
A criança introjeta uma sensação de abandono.O bebê precisa do
toque, do colo, do cheiro, dasensação corporal.
Depoimento de Ana Paula Barbieri, advogada, mãe de Gael e Pablo
Para mostrar aos meus filhos que estão fazendo algo errado,
chamo Para mostrar aos meus
filhos que estão fazendo algo errado, chamo a atenção com tom de voz mais firme
e mais alto do que o normal, para deixar claro que não gostei, que aquilo não é
legal. Então, procuro explicar o motivo. O Gael tem 6 anos, já entende muita
coisa, é capaz de manter um diálogo e até mesmo de argumentar. Ele já entende o
tom de voz diferente e reage quando é contrariado.
Nunca fui a favor do tal cantinho pra pensar, nunca dei esse
tipo de castigo pros meus filhos nem vou dar. O Gael gosta de brincar na
pracinha perto de casa, gosta que a gente conte histórias, para citar alguns
exemplos. Já notei que ameaçá-lo de ficar sem ou deixá-lo temporariamente sem
alguma dessas atividades surte mais efeito do que deixá-lo de castigo.
Depoimento de Naiana Borges, atriz e jornalista mãe de João e
Maria.
Em casa, a
gente tenta ao máximo falar com as crianças, explicar por que mamãe ou papai
está pedindo tal coisa. O castigo acontece, não vou negar, mas ele é muito mais
um tempo para os ânimos baixarem do que qualquer outra coisa. Nossa frase é
‘fique um pouquinho no seu quarto para você se acalmar, depois a gente
conversa’. E não demoramos mais do que cinco minutos para voltar. Não acredito
em castigo que ensine.
No meu entender, qualquer relação se fortalece com muita
conversa franca, e na relação entre pais e filhos não poderia ser diferente.
Acredito que essa história de ‘pensar por alguns minutos’, muito usada por aí,
faça a criança associar a ideia de ‘pensamento’ a algo ruim. Eu e Diogo não
somos de ‘passar a mão na cabeça’. A gente não só diz que ‘é errado’ ou ‘feio’.
A gente faz questão de demonstrar nossa chateação. Se a gente não demonstrar
aquilo que está no discurso, de nada adianta. Pra mim, tudo isso só vale mesmo
com carinho.
Educar é dar carinho